Por: Dom Odilo Pedro Scherer – Arcebispo Metropolitano de São Paulo
No domingo, 10 de outubro, o Papa abriu em Roma a preparação da assembleia do sínodo sobre a sinodalidade. Na missa, na Basílica de São Pedro, estavam presentes, além de muitos cardeais e bispos, também uma representação da Igreja dos cinco continentes, que receberam simbolicamente, no fim da celebração, o envio do Papa para partir e animar o caminho sinodal nas Igrejas locais do mundo inteiro. No próximo domingo, dia 17 de outubro, o mesmo rito se repetirá em cada diocese do mundo, presidido pelo bispo local. O tema do sínodo é: “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”.
Na homilia, o Papa Francisco discorreu sobre aspectos importantes do processo sinodal, que deve envolver a todos os batizados, resumindo em três verbos as ações da experiência sinodal: encontrar, ouvir e discernir. O processo sinodal deve ser expressão de uma “Igreja em saída”, que vai ao encontro de todos, com abertura e disposição de acolher e ouvir o que as pessoas dizem. É preciso superar as fronteiras do individualismo ou da autossuficiência, ou também dos preconceitos, que impedem o apreço pelo bem que há nos outros.
A outra atitude é escutar, como Jesus fez, indo ao meio das pessoas nas mais diversas situações em que se encontram. A quem ouvir? A todos: pequenos e grandes, ricos e pobres, doentes e pessoas com saúde, quem tem fé e quem não a tem, quem aprecia o trabalho da Igreja e quem o critica. Ouvir com atenção sincera. O terceiro verbo é discernir, depois de ouvir muito. A escuta leva necessariamente a questionamentos, análises e tomada de atitudes e decisões.
O Papa também observou que o sínodo não é um congresso teológico sobre o tema da sinodalidade, mas um chamado a fazer uma experiência de “Igreja sinodal”. Várias vezes observou que o sínodo não é um Parlamento, onde se tenta fazer valer as próprias ideias ou propostas, buscando consensos e maiorias. Disse ainda que não se trata de uma sondagem de opiniões sobre isso ou aquilo, mas de um evento eclesial, animado pelo Espírito Santo. Por isso, todos devemos nos abrir à ação do Espírito Santo e ser dóceis às suas inspirações.
Uma Igreja sinodal também não deve estar preocupada logo com a mudança das estruturas eclesiais, ou com a criação de novas estruturas. Isso poderia acabar naquilo que Jesus preveniu no Evangelho: remendo de pano novo em roupa velha… Trata-se bem mais de um processo de conversão, no qual a Igreja busca ser sempre mais aquilo que ela é chamada a ser desde o princípio: o povo dos discípulos missionários de Jesus Cristo, testemunhas alegres do seu Evangelho no mundo, família de irmãos reunidos na mesma fé, esperança e caridade. Trata-se de uma mudança de mentalidade, passando de uma Igreja vista sobretudo como instituição e organização, para uma Igreja de pessoas, povo de Deus, povo de irmãos e de testemunhas.
Igreja sinodal é aquela em que os seus membros procuram caminhar juntos na mesma direção, tendo à frente Jesus Cristo, caminho, verdade e vida. A Igreja será verdadeiramente sinodal se todos caminharem juntos na fé, esperança e caridade, virtudes recebidas no Batismo para darem forma à vida cristã. A unidade do caminho é dada por Jesus-caminho, que todos devemos seguir com sinceridade, e construída na comum esperança e busca dos bens prometidos, que animam os passos da Igreja. E será tanto mais concretizada, quanto maior e intensa for a caridade fraterna.
As divisões na Igreja, provocadas por tantos motivos, mas sobretudo pelos individualismos, soberbas e vaidades, são contrárias à genuína sinodalidade da Igreja. Uma Igreja sinodal será aquela na qual os membros procuram ouvir uns aos outros, estar atentos às necessidades e sofrimentos dos outros, ajudando-se mutuamente, sobretudo nas suas dificuldades. Será aquela em que as comunidades, além de olharem para seu próprio bem, estão abertas e disponíveis para socorrer as dores e sofrimentos dos irmãos.
Uma Igreja mais sinodal será aquela que celebra a Liturgia com profunda fé, reza pelas necessidades dos outros, proclama o louvor de Deus e reconhece o bem que Ele faz em toda parte. É a Igreja reunida em torno da mesma Palavra de Deus, acolhendo-a e respondendo com fé, e em torno da mesma Eucaristia, mesmo celebrada em tantos altares diferentes. A Igreja sinodal acontece na qual cada um coloca o próprio dom a serviço do bem de todos, deixando-se beneficiar pelo dom dos outros. É ainda a Igreja que se coloca em atitude de missão permanente, sabendo que a missão é de todos e que o dom da fé deve ser comunicado com generosidade aos outros.
Enfim, a Igreja sinodal tem Deus por Pai (“um só Deus e Pai”), Jesus Cristo como irmão (“um só Cristo e Senhor”), Salvador de todos; e o mesmo Espírito Santo (“um só Espírito”), que está em todos, anima e faz crescer a Igreja. Uma Igreja sinodal sabe que tem Maria por Mãe e os Santos como irmãos e intercessores em todos os momentos. Não parece tão difícil ser uma Igreja sinodal. Difícil é a mudança de nossa mentalidade, para compreendermos assim a Igreja e nossa participação nela.
Texto publicado originalmente em 13 de outubro de 2021, no jornal O São Paulo – Arquidiocese de São Paulo
Foto: Vatican Media